Câmara aprova PEC da Blindagem

A Câmara dos Deputados aprovou, na noite de terça-feira (16/9/2025), o texto-base de uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que amplia as prerrogativas de deputados e senadores no que diz respeito a processos criminais. Chamadas de “PEC das Prerrogativas” ou “PEC da Blindagem”, essas mudanças geram controvérsias intensas sobre seus impactos no sistema de justiça, no equilíbrio entre os Poderes e na responsabilização de agentes públicos.
O que foi votado
- No primeiro turno, o texto-base foi aprovado por 353 votos a favor e 134 contra.
- No segundo turno, a aprovação se repetiu: 344 votos favoráveis e 133 contrários.
- Após o segundo turno, os deputados passaram a analisar destaques, que são ajustes ou retiradas de trechos específicos do texto-base.
- Depois dessa etapa, se mantido, o texto seguirá para o Senado, onde também deverá ser aprovado em dois turnos.
Principais mudanças propostas
A PEC 3/2021 altera regras relativas à imunidade parlamentar, ao foro privilegiado e à tramitação de processos criminais contra deputados e senadores. Entre os pontos mais relevantes estão:
Autorização do Congresso para processar
Qualquer ação penal contra parlamentares que deva tramitar no Supremo Tribunal Federal (STF) dependerá de autorização prévia da Câmara ou do Senado, por votação secreta.
Imunidade parlamentar reforçada
Deputados e senadores só poderiam ser responsabilizados por atos ligados ao exercício de suas funções mediante processo no Conselho de Ética da respectiva Casa.
Abertura de processo criminal
A Justiça ficaria proibida de abrir processo criminal contra congressistas sem autorização prévia do Legislativo.
Prisão em flagrante
A prisão de parlamentares só seria possível em flagrante de crimes inafiançáveis previstos na Constituição. Mesmo nesses casos, a Casa Legislativa correspondente teria a palavra final.
Afastamento do mandato
Juízes não poderiam determinar o afastamento cautelar de parlamentares de seus mandatos. Essa decisão caberia exclusivamente ao Congresso.
Busca e apreensão
Qualquer medida de busca e apreensão em gabinetes de congressistas precisaria ser autorizada pelo plenário do STF, com acompanhamento da Polícia Legislativa.
Foro privilegiado ampliado
Presidentes nacionais de partidos políticos com representação no Congresso passariam a ter foro direto no STF em investigações relacionadas às suas funções, mesmo sem mandato parlamentar.
Julgamento de presidentes de partidos
Além da prerrogativa de foro, a proposta prevê que esses dirigentes sejam julgados diretamente pelo Supremo.
Suspensão da prescrição
Caso a Câmara ou o Senado neguem autorização para o andamento de um processo ou para a prisão de um parlamentar, o prazo prescricional ficaria suspenso até o fim do mandato.
Inelegibilidade
Um parlamentar só poderia ser considerado inelegível após condenação confirmada em segunda instância.
Alterações removidas após destaques
Um destaque apresentado pelo partido Novo tentou excluir a exigência de votação secreta para autorizar processos contra parlamentares. A proposta, no entanto, não recebeu apoio suficiente e foi retirada.
Contexto histórico e jurídico
- A Constituição de 1988 previa que, para determinados crimes, parlamentares só poderiam ser processados com autorização de suas respectivas Casas (Câmara ou Senado). Essa regra foi modificada em 2001, eliminando parte dessa exigência, para reduzir críticas de impunidade.
- Mais recentemente, decisões do STF têm reafirmado e até ampliado o foro especial por prerrogativa de função. Em março de 2025, por exemplo, o STF decidiu que investigações iniciadas na Corte continuam sob sua competência mesmo após o fim do mandato do parlamentar, em casos relativos às funções exercidas.
Os argumentos favoráveis
Defensores da PEC alegam que a proposta é necessária para proteger a independência do mandato parlamentar, garantir que não haja abusos judiciais e assegurar que parlamentares possam exercer suas funções sem medo de perseguição ou intimidação jurídica. Hugo Motta, presidente da Câmara, classificou a proposta como um retorno ao texto constitucional original de 1988, defendendo que não se trata de favorecimento pessoal, mas de proteção institucional.
As críticas e os riscos apontados
- Impunidade e enfraquecimento do controle: Críticos afirmam que essas mudanças tornarão muito mais difícil o exercício de mecanismos de responsabilização, sobretudo em casos de corrupção ou abuso de poder. Processo criminais contra parlamentares poderão depender excessivamente da vontade interna do Congresso.
- Distanciamento entre representantes e eleitores: A exigência de autorização da Casa, especialmente se em votação secreta, pode impedir que eleitores saibam como seus representantes estão posicionados frente a acusações sérias.
- Desigualdade no sistema judicial: A sensação de que parlamentares estariam acima de cidadãos comuns pode aumentar, sobretudo quando se exige ou define prerrogativas que não se aplicam a outro tipo de agente.
- Conflito entre Poderes: Há preocupação de que a proposta estimule embates entre Judiciário e Legislativo, em um momento em que decisões do STF têm tido grande repercussão política.
Situação atual e próximos passos
- A Câmara seguirá analisando os destaques à PEC, que podem modificar ou retirar partes específicas do texto aprovado.
- Depois de finalizada na Câmara, a proposta segue para o Senado, onde também precisará ser votada em dois turnos.
- O presidente da Casa, Hugo Motta, indicou que há articulação partidária significativa para aprovar a proposta, inclusive do Centrão.
A PEC das Prerrogativas configura uma mudança de grande impacto institucional. Vai além de uma disputa política momentânea: altera diretamente as regras de convivência entre Legislativo e Judiciário, assim como a forma como cidadãos veem a responsabilização de seus representantes. O desfecho no Senado terá igual importância para o futuro do tema.